Considerações sobre o lugar dos pais na psicoterapia de crianças e adolescentes

pais_e_filhosAo recebermos uma criança para avaliação, não a recebemos apenas. Recebemos também seus pais, seus avós, seus irmãos, seu ambiente, de forma concreta ou não. E todas estas pessoas se tornam fatores importantes, até mesmos decisivos, para o sucesso ou fracasso de uma psicoterapia.

Na maioria dos casos onde há procura por atendimento psicoterápico, os pais/responsáveis já realizaram um sem número de tentativas de ajuda para esta criança que está em sofrimento. Também vemos como as famílias fazem tentativas de se adaptarem ao comportamento sintomático que seus pequenos membros apresentam, e se o terapeuta não for sensível o suficiente para compreender toda esta cadeia, pode ter dificuldades em executar o que se propõe.

Percebemos, muitas vezes, que não há somente o comportamento do paciente, mas também a bagagem que esta família carrega. Como lidar com as semelhanças e também com as diferenças? Observações como “ele é igual a mim quando eu tinha esta idade” são frequentes no discurso dos pais.

Devemos pensar também nas relações vinculares que como terapeutas estabelecemos com os familiares de nossos pacientes, nos questionando sempre sobre quem é o nosso paciente. Pela sensibilidade de muitas crianças, estas podem nomear a doença da família, tornando-se depositárias de uma bagagem que nem sempre é só delas.

Todos escutamos, ao atendermos crianças principalmente, o quão rápido é o retorno que elas apresentam, tanto em questões vinculares como em melhora sintomática, e se isto não estiver sendo bem trabalhado com os pais/responsáveis, para que se sintam também acolhidos e entendidos, é como se faltasse uma parte do tripé paciente – terapeuta – família.

Os conflitos, ansiedades, fantasias vão sendo desvendados e vão recebendo um destino com o passar do tempo e do tratamento. Isto mostra como se torna importante um contato sólido e frequente com os familiares, uma vez que podemos notar que quando um membro do grupo familiar está em psicoterapia, os outros familiares também podem ter benefícios em razão disto.

Nos vínculos estabelecidos com os familiares, somos tomados por situações onde reagimos a estes. Podemos nos identificar mais com um do que com outro e tudo isto serve para comunicar e também é material de trabalho. As reações contratransferenciais não se dão apenas com o paciente ao qual atendemos, mas também com seus pais/responsáveis.

No capítulo “O Lugar dos Pais na Psicoterapia de Crianças e Adolescentes” do livro Crianças e Adolescentes em Psicoterapia – a Abordagem Psicanalítica das autoras Maria da Graça Kern Castro e Annie Stürmer, estas citam o exemplo da escola francesa, onde a criança busca se identificar com o que imagina ser o desejo materno. E como trabalhar só com a criança, no momento em que também temos este desejo influenciando nela? Desejo que muitas vezes é inconsciente até mesmo para os pais?

Uma mãe pode estar, por exemplo, num sofrimento bastante significativo ao sentir a filha num movimento de separação / individuação que pode estar sendo trabalhado em psicoterapia, pois pode se dar conta, ao se trabalhar esta questão nas sessões com os pais, que ela (a mãe) ainda não está pronta para passar por este processo.

Nas questões transgeracionais, o terapeuta pode estar no lugar de um terceiro, que interdita algumas repetições e que ajuda a que se tire os fantasmas de dentro do armário.

O terapeuta de crianças e adolescentes precisa ter uma postura mais flexível, assim como estar atento para o caso de necessitar utilizar recursos que talvez com um adulto não pensasse em utilizar. Penso que devemos ter a capacidade de sermos terapeutas suficientemente bons, com a plasticidade necessária para irmos e virmos com nossos pacientes e também com seus pais, que apesar de serem grandes em tamanho, muitas vezes se sentem e se mostram tão desamparados.

Também penso ser fundamental que entendamos os limites que se apresentam, como o fato de que por mais que desejemos ajudar uma criança que possa estar em sofrimento emocional, apenas o nosso desejo e a nossa habilidade podem não ser suficientes, pois existe a figura real dos pais e que estes são determinantes para as decisões a serem tomadas quanto ao tratamento de seus filhos.

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* Texto elaborado com base no capítulo “O Lugar dos Pais na Psicoterapia de Crianças e Adolescentes” do livro Crianças e Adolescentes em Psicoterapia – a Abordagem Psicanalítica, das autoras Maria da Graça Kern Castro e Annie Stürmer, 2009, editora artmed.