Sobre a força de… desistir?

Simone Biles é uma ginasta estadunidense que se destacou nos Jogos Olímpicos. Ganhou visibilidade na mídia por sua escolha de “desistir” de competições, a fim de preservar sua saúde mental. A decisão da jovem foi tomada junto à equipe médica visando evitar possíveis lesões graves, dado que a atleta relatou sofrer de twisties, problema referido como uma falta de sincronia entre o corpo e a mente.

Conforme mostram algumas manchetes que noticiam o ocorrido[1][2][3][4][5], há uma tendência a classificar a decisão da ginasta como uma “desistência”, o que talvez remeta à ideia do fracasso em relação a um objetivo não alcançado, ainda que por vontade própria, já que desistir implica voluntariedade. No esporte, embora a participação seja valorizada, o que predomina é o desejo de ganhar, e essa perspectiva faz sentido, pois o objetivo último da competição é a medalha de ouro. Contudo, há outras dimensões que atravessam a vida de uma pessoa e influenciam suas resoluções, seja em âmbito pessoal, acadêmico ou profissional.

Quando Simone opta por se afastar da disputa, ela sinaliza uma reorganização de suas prioridades, colocando sua saúde mental em primeiro lugar. Conforme também apontam muitas notícias, essa decisão demonstra coragem, uma vez que se distancia da visão unidirecional e inflexível que vislumbra o ganhar a qualquer custo enquanto modo de vida. A escolha da jovem afronta a tradição normativa e repressora predominante em gerações passadas, apoiada na valorização extremada da autoridade hierárquica.

Pode ser difícil sustentar as próprias escolhas, por diversas razões, como o conflito com as próprias vontades, a expectativa do outro e a preocupação com o futuro. É uma tarefa árdua divergir da norma e se desprender das amarras do costume. No entanto, a escolha de Simone Biles marca um importante passo na necessária mudança de atitude em relação ao esporte, que reflete também uma imprescindível transformação na sociedade e na forma pela qual nos relacionamos com a tradição.

Isso não é desistência, é força.

Adams Friedemann, CRP 07/31976, psicólogo (UFCSPA), bacharel em Filosofia (PUCRS) e mestrando em Psicologia (UFRGS).

E-mail: adamsfmann@gmail.com

Instagram: @adams.psi


Foto: Martin Bureau/AFP. Recuperado de: https://www.mg.superesportes.com.br/app/noticias/especiais/olimpiadas/toquio/noticias/2021/08/01/toquio,3928934/simone-biles-desiste-de-competir-na-final-do-solo-em-toquio.shtml

[1] https://ge.globo.com/olimpiadas/noticia/simone-biles-desiste-de-disputar-a-final-no-solo-nas-olimpiadas-nas-olimpiadas.ghtml

[2] https://www.terra.com.br/esportes/jogos-olimpicos/simone-biles-desiste-de-mais-uma-final-nos-jogos-olimpicos,7ed7598da5e393a2a62cc2db6eab03e7nki181rw.html

[3] https://www.mg.superesportes.com.br/app/noticias/especiais/olimpiadas/toquio/noticias/2021/08/01/toquio,3928934/simone-biles-desiste-de-competir-na-final-do-solo-em-toquio.shtml

[4] https://gauchazh.clicrbs.com.br/esportes/noticia/2021/08/simone-biles-desiste-de-competir-na-final-do-solo-em-toquio-ckrsppya4006601eb0x4r3ou4.html

[5] https://www1.folha.uol.com.br/esporte/2021/08/apos-desistir-de-quatro-finais-biles-estuda-se-brigara-por-medalha-na-trave.shtml